Espasmos e um Café Derramado: minha vida com a epilepsia

Espalhar informação e conscientizar sobre epilepsia pode ajudar milhões de pessoas vivendo com essa condição

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Tábata Bublitz

Pesquise ‘coisas roxas’ no google e um dos primeiros resultados, é claro que é a ametista. Outros resultados incluem flores como a violeta, um fusca roxo e – minha preferida – a framboesa roxa. No entanto, o 'Dia Roxo' foca em algo bem mais sério do que qualquer um dos resultados acima: a epilepsia. É uma condição com a qual 65 milhões de pessoas convive no mundo inteiro, e no Brasil, afeta em torno de 240 mil pessoas com idade acima de 15 anos. 26 de março é um dia em que pessoas do mundo inteiro se mobilizam para promover conscientização sobre a doença, desfazer mitos em torno do distúrbio e oferecer suporte a todos os que convivem com ele. Uma pessoa em especial, parte da equipe MyTherapy, Tábata Bublitz vem convivendo com epilepsia desde a adolescência. Para que possamos entender um pouco sobre a doença, ela compartilhou conosco suas experiências com a epilepsia.

Conte-nos sobre sua expriência com a epilepsia nos comentários abaixo!

Os primeiros dias com a epilepsia

Minhas primeiras crises começaram nos meus 14 anos, e no começo, nem eu nem meus pais sabiam o que elas eram e o que fazer em relação à elas. Eu tive dois episódios em que perdi a consciência. Um deles aconteceu enquanto estava dormindo, (após ter ido em minha primeira balada). Hoje sei que as constantes luzes e a música alta foram os fatores desencadeantes. Nem eu sabia, mas cerca de 45% das crises ocorrem durante o sono. E meu outro episódio convulsivo aconteceu durante uma situação de forte estresse.

Antes da convulsão, lembro que senti a chamada aura que me fez saber de antemão que teria uma crise epiléptica ali mesmo. Somente após esse episódio, o médico confirmou que se tratava de epilepsia, mas sem saber exatamente qual era o tipo.

Mesmo antes de ter as convulsões, cheguei a notar uma mudança no controle dos meus movimentos. Em certos momentos, até segurar uma xícara de café quente era perigoso, considerando que minhas mãos eram tomadas de movimentos súbitos e involuntários e sempre havia o risco de me queimar (em um certo momento, isso realmente aconteceu!).

Desde então, acordar de súbito, passar por situações de stress, fazer movimentos muito rápidos com a cabeça, ouvir barulhos altos e levar susto de outros começaram a desencadear espasmos ou crises de ausência, especialmente se eu não ingerisse meu medicamento corretamente.

Diagnosticada com Epilepsia Mioclônica Juvenil

Fui levada a um neurologista e, após infinitos eletroencefalogramas, foi concluído que minha epilepsia era do tipo mioclônico, uma síndrome que geralmente surge na adolescência e é caracterizada por espasmos que podem ser pequenos e breves, mas que se espalham por todo o corpo. Além disso, esse tipo de epilepsia não tem cura, e é preciso um tratamento para toda a vida, como é meu caso.

Conforme a Sociedade Americana de Cirurgiões, “As crises ocorrem devido a uma mudança temporária nas ondas elétricas cerebrais. O cérebro continuamente gera pequenos impulsos elétricos em um padrão ordenado. Estes impulsos viajam ao longo neurônios – a rede de células nervosas no cérebro – e por todo o corpo por meio de mensageiros químicos chamados neurotransmissores”.

“Na epilepsia, no entanto, os ritmos elétricos do cérebro têm uma tendência a tornarem-se desequilibrados, resultando em crises recorrentes. Em pacientes com crises, o padrão elétrico normal é interrompido por explosões repentinas e sincronizadas de energia elétrica, que podem afetar momentaneamente a consciência, movimentos ou sensações”.

A Epilepsia Mioclônica Juvenil, por exemplo, constitui cerca de um terço de todas as epilepsias. Ela não está relacionada a acidentes ou traumas no cérebro, pois as descargas elétricas atingem os dois hemisférios ao mesmo tempo. Por mais que na medicina ela seja descrita como uma alteração benigna, estudos tem demonstrado uma tendência à alterações de comportamento e, em muitos casos, déficit de atenção.

Além da EMJ, há também a epilepsia do lobo temporal, uma síndrome comum em adultos, embora o início das crises geralmente ocorra na infância. Este tipo de epilepsia é uma das que mais afeta a qualidade de vida dos portadores.

As crises desse tipo de epilepsia começam no lobo temporal e podem afetar também o hipocampo (geralmente a parte que fica no lado esquerdo do cérebro), que é a parte envolvida nos processos de aprendizagem e consolidação da memória recente. O que acontece é que, se as crises forem constantes, os tecidos cerebrais são danificados e assim, a atividade cognitiva é afetada.

Como a aura se manifesta

Muitos dos que vivem com Epilepsia já estão familiarizados com a aura. Cada pessoa sente algo diferente e, pode ser difícil de explicar. Basicamente, ela é caracterizada por preceder a crise epiléptica.

As minhas sensações pré-crise não mudaram quase nada ao longo do tempo. O fato é que, como eu venho seguindo um tratamento com doses diárias de anticonvulsivos, as convulsões cessaram, mas os espasmos ainda ocorrem. Recentemente passei por situações de estresse extremo, nos quais fiquei aérea e perdi a noção de onde estava, quase que completamente. Além disso, algo que não tinha me ocorrido antes: a taquicardia (um aumento na frequência cardíaca).

Minha reação a isso normalmente envolve alertar as pessoas ao meu redor, sobre a possibilidade de eu ter uma crise convulsiva, para que possam me ajudar. Também tento focar minha visão em algum objeto fixo e isso ajuda a evitar a tontura. Nestes casos sinto como se flutuasse ou estivesse caindo. Por isso geralmente procuro sentar para evitar me machucar.

Fatos que todos deveriam saber

O Dia Roxo, ou Purple Day, é uma data super importante para informar à população sobre o que realmente é epilepsia. Ainda existem muitos mitos em torno da doeça, como por exemplo:

  • Muitos pensam que a epilepsia é contagiosa, e têm medo de “contrair” a doença por meio da saliva.
  • Alguns acreditam que a epilepsia está ligada à loucura.
  • A maioria não sabe como agir ao presenciar um ataque epiléptico. Devido à falta de conhecimento, muitos pensam que deve-se segurar os braços e a língua, para que não se mordam ou se machuquem
  • Ainda hoje existem pessoas que acreditam que convulsões são possessões demoníacas, e am alguns casos, os colchões de quem tivesse passado por uma crise, eram queimados para afastar os espíritos.

Além de desfazer os mitos, é importante que as pessoas compreendam como a epilepsia funciona e como afeta a vida dos portadores. É importante também que saibam como reagir na presença de alguém tendo uma convulsão.

Isso permite que determinados padrões de comportamento de quem convive com o distúrbio sejam melhor compreendidos. Muitos presenciam um aumento nos níveis de ansiedade, outros têm lapsos frequentes de memória e também problemas de concentração. Quando uma crise ocorre, a última coisa que precisamos é de pessoas com preconceito, que não ajudem por conta de medos infundados.

É preciso conscientizar a população em geral de que, para ajudar alguém que esteja convulsionando, é preciso saber as maneiras certas de agir. Deve-se afastar qualquer objeto ou móvel que esteja por perto para que ele/ela não se machuque durante as contrações musculares.

E deve-se evitar tentar segurar a língua! Ao faze-lo, a pessoa pode corre o risco de perder os dedos, devido à força com que as contrações ocorrem. Ao invés disso, deite-o (a) de lado para evitar que sufoque com a saliva. Se as convulsões durarem mais de 5 minutos, chame o serviço de emergência.

A conscientização é essencial

A epilepsia é uma condição grave, mas que pode ser mantida sob controle com o uso de medicações. Quanto mais pessoas tiverem ao menos um conhecimento básico sobre a doença, mais seguro o mundo se torna para nós que vivemos com ela, especialmente quando as crises se desencadeiam.


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