Sabia que Portugal está hoje entre os dez países da Europa com maior taxa sobrevivência a cancros como o da mama ou da próstata? São dados promissores, que atestam a eficácia das medidas públicas de rastreio e sensibilização. Mas embora a taxa de sobrevivência tenha aumentado, a taxa de incidência também, e só será possível continuar a melhorar estes números se a população se mantiver alerta. Este Dia Mundial do Cancro, adoptamos o lema da campanha 2019-2021, “Eu Sou e Eu Vou”, para lhe dar algumas recomendações.
Prevenir e vigiar antes de remediar
A luta contra o cancro pode começar bem antes do diagnóstico. Segundo a OMS, cerca de 30 a 50% dos cancros são evitáveis. Em resumo, embora os hábitos saudáveis não garantam que nunca se vá ter uma doença oncológica, adoptar um estilo de vida saudável reduz significativamente as probabilidades de a desenvolver.
Mas todos se devem manter alerta para a possibilidade de virem a ter um cancro. As taxas de sobrevivência são significativamente maiores quando o rastreio é regular e o diagnóstico precoce. São estes pilares, a prevenção e a vigilância, que guiam as 12 dicas do Código Europeu Contra o Cancro:
1.“Não fume.”
Por aqui não há novidades. O tabaco é a principal causa de cancro e metade dos fumadores de longo prazo morrerá de causas associadas ao tabagismo. Fumar provoca até 82% dos casos de cancro do pulmão na Europa. Também aumenta significativamente a probabilidade de se desenvolver cancros como o da laringe, o da bexiga e do esófago. Deixar de fumar antes dos 40 anos reduz o risco de morte relacionada com o tabagismo em perto de 90%, mas os riscos diminuem mesmo para quem desiste mais tarde.
2. “Faça da sua casa uma casa sem fumo.”
Também o fumo passivo pode ter consequências negativas para a saúde. Desde 2008 que é proibido fumar em espaços fechados em Portugal. Mas só em 2017 entrou em vigor a lei que proíbe que se fume em espaços destinados a crianças, mesmo que ao ar livre. O progresso nesta área é importante, já que os dados indicam que os não fumadores regularmente expostos a fumo passivo têm até o dobro de probabilidades de desenvolver doença oncológica em comparação com os que não têm.
3. “Tome medidas para ter um peso saudável.”
Embora o índice de massa corporal (IMC) tenha as suas limitações, os dados sugerem que quem tem este indicador dentro dos valores normais e um estilo de vida saudável apresenta um risco 18% inferior de desenvolver doenças oncológicas. A obesidade e o excesso de peso aumentam o risco de desenvolver cancros como o do intestino, o do rim, do esófago e do pâncreas. Nas mulheres, também o risco de cancro do útero, dos ovários e da mama (pós-menopausa) é maior. Se conseguir controlar o seu peso ao adoptar um estilo de vida mais saudável, é aconselhável que o faça.
4. “Mantenha-se fisicamente activo.”
Incorporar a actividade física na sua rotina não só pode ajudar com o ponto 3 como traz as suas próprias salvaguardas. O impacto do exercício físico no corpo humano é enorme. A sua utilidade na manutenção da saúde hormonal e mental é já comprovada, e existem até indícios de que pode ajudar a controlar os seus níveis de colesterol. Estima-se que o risco de cancro seja até 4% menor em pessoas moderadamente activas (cerca de 30 minutos por dia). É também é importante salientar que esta ideia de “actividade física” não incluí apenas as actividades tradicionalmente associadas ao exercício físico, mas também qualquer movimento que envolva a utilização de músculos. Embora incorporar o exercício físico seja extremamente benéfico, até adoptar hábitos como andar a pé ou subir escadas pode ter um impacto positivo na sua saúde.
5. “Tenha uma dieta saudável.”
A abundância de artigos aparentemente contraditórios sobre nutrição pode levar qualquer um ao desespero. A verdade é que uma alimentação saudável é simplesmente aquela que satisfaz as suas necessidades calóricas e nutricionais, e isso varia bastante de pessoa para pessoa. Ainda assim, o Código Europeu Contra o Cancro adianta uma série de directrizes simples que o podem ajudar. É boa ideia consumir bastantes frutas, legumes e cereais integrais. Deve evitar as carnes processadas, os alimentos muito calóricos ou ricos em sal e açúcar.
6. “Se consumir álcool, limite o seu consumo. Não consumir bebidas alcoólicas é benéfico para a prevenção do cancro.”
É uma pena, mas beber aumenta mesmo o risco de doença oncológica. Apesar dos muitos artigos acerca das outras propriedades benéficas de bebidas como o vinho tinto, a realidade é que todos os tipos de bebidas alcoólicas podem aumentar as suas hipóteses de desenvolver cancro. O problema está no álcool em si. Mas nem todas as bebidas têm o mesmo teor alcoólico e os riscos aumentam significativamente se o volume de consumo de álcool for elevado. Se bebe, é boa ideia reduzir. Se não bebe, ainda melhor!
7. “Evite a exposição excessiva ao sol, especialmente para as crianças. Use protector solar. Não use solários.”
A exposição excessiva à radiação ultravioleta (UV) da luz solar pode levar ao desenvolvimento de cancro da pele. A definição de “exposição solar excessiva” depende de pessoa para pessoa, já que varia conforme o seu tipo de pele, intensidade da luz solar e localização geográfica. É preciso ser particularmente cuidadoso entre as 11h e as 15h, especialmente se tiver pele clara. Use protector solar e proteja o pescoço, a cara e as mãos. A OMS também assegura que isto não o tornará carente em vitamina D, já que para uma pessoa saudável, basta passar algum tempo ao sol para que ela seja produzida nas quantidades necessárias. Salvo os raros casos em que é prescrita por motivos clínicos, também a utilização de solários é totalmente desaconselhada.
8. “No seu local de trabalho, proteja-se de substâncias cancerígenas seguindo as instruções de segurança e saúde.”
Proteger os cidadãos das substâncias químicas com potencial cancerígeno é um dever dos governos e empregadores. Os trabalhadores e cidadãos podem e devem participar em acções comunitárias destinadas a encorajar as intervenções adequadas sempre que suspeitam que a sua segurança não está a ser salvaguardada. A nível pessoal, cada um pode contribuir para um ambiente menos poluído ao reduzir o uso de automóveis e ao eliminar correctamente os resíduos e os produtos químicos de uso doméstico.
9. “Verifique se está exposto a radiação derivada de altos níveis de rádon natural em casa.”
Há vários tipos de radiação. Aquela que pode ser prejudicial para a saúde é a radiação ionizante, já que é forte o suficiente para quebrar as ligações químicas entre as células e pode causar mutações no ADN. Pode ser exposto a este tipo de radiação através do rádon, um gás natural radioactivo que pode criar danos pulmonares. Se está exposto a rádon em casa, proteger-se dele pode implicar obras que impeçam a sua entrada através do solo. No local de trabalho, tem o direito de exigir aos seus empregadores que façam o mesmo. Também certos procedimentos médicos, como os raios-x ou a radioterapia, envolvem a radiação ionizante. É, no entanto, importante enfatizar que os médicos tendem a ser cautelosos ao pedir estes procedimentos. Recusar este género de exames ou tratamentos quando eles são necessários pode ter consequências bem mais graves para a saúde do que aumento negligenciável de exposição à radiação que eles implicam.
10. “Se é mulher e tiver essa possibilidade, amamente, já que isto reduz o risco de cancro da mama. Limite também o recurso à terapia de substituição hormonal, que aumenta o risco de determinados cancros.”
Os benefícios do leite materno para o bebé são já amplamente conhecidos. Ele é associado à protecção contra doenças infantis, à manutenção de um peso saudável e até à redução do risco de doença crónica na idade adulta. Mas as mulheres que amamentam também apresentam menor risco de vir a desenvolver cancro da mama. A redução é de cerca de 4% por cada doze meses de amamentação. O aumento do risco associado à terapia de substituição hormonal, normalmente utilizada para amenizar os sintomas da menopausa, também já foi comprovado. A Agência Reguladora de Medicamentos e Produtos para a Saúde do Reino Unido (MHRA, na sigla inglesa), recomenda que se recorra a estas hormonas apenas “nas doses mais baixas” e “durante um curto período de tempo”. As mulheres que já efectuaram estes tratamentos também devem manter-se particularmente vigilantes no que toca ao rastreio.
11. “Assegure-se de que os seus filhos estão vacinados.”
Pode não parecer uma associação óbvia, mas a verdade é que quase um quinto de todos os cancros é causado por agentes infecciosos como os vírus e as bactérias. A maioria dos casos de cancro do colo do útero, por exemplo, está associada ao vírus do papiloma humano (VPH ou HPV, na sigla inglesa). Em Portugal, a vacina do HPV já faz parte do Programa Nacional de Vacinação (PNV) e é administrada às raparigas dos 10 aos 18 anos. Também a vacina contra a Hepatite B reduz o risco de vir a desenvolver o cancro do fígado que lhe é associado.
12. “Participe em programas organizados de rastreio.”
O rastreio, despiste do cancro em pessoas aparentemente saudáveis, é uma das maiores armas na luta para a reduzir a letalidade e até a própria incidência da doença oncológica. O procedimento é recomendado para os cancros em que a detecção precoce reduz significativamente a taxa de mortalidade. É o caso de cancros como o do intestino, do colo rectal, do colo do útero e da mama. Em Portugal, as taxas de rastreio tendem a estar acima das da média europeia. A taxa de rastreio do cancro da mama foi mesmo a maior da Europa em 2013.
São sinais animadores, mas há muito mais a fazer. Nas palavras do oncologista Joaquim Abreu de Sousa, coordenador da Clínica de Mama do Instituto Português de Oncologia (IPO), é preciso criar a consciência de que o cancro não é necessariamente uma sentença de morte mas sim “uma doença que se pode tratar”.
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